quinta-feira, 30 de julho de 2009

Estado Pacóvio








Com o tempo ficamos mais tolerantes, aceitamos melhor o “suposto mal” que nos querem fazer, elevamo-nos na "insustentável leveza do ser" (talvez, o filme que mais me marcou…), ficamos mais leves, deixamos que a alma nos observe a nós próprios e ao mundo envolvente, ou seja, aos outros a quem dedico este espaço, no descolar da alma do ego e aceitar quase tudo, posso dizer mesmo tudo.

Por vezes, sinto (agora na primeira pessoa do singular) que vivo numa sociedade arcaica, rude e primitiva. Ainda hoje ouvi duas notícias bizarras:

- proibição de andar em tronco nu ou em fato de banho nas ruas de Cannes, para promover os bons costumes… além das multas, a polícia distribui t-shirts aos abusadores… assim, o Estado pacóvio arroga-se destes abusos mundanos! Os senhores polícias multam todos os que mostrem o que Deus lhes deu, melhor ou pior segundo o conceito variável da estética de cada um, e assim lavram umas multas oficiais e distribuem camisolas a quem ofender a moralidade e o pudor público (quem pagará a produção das referidas farpelas?), assim se aplica o dinheiro público no Sul de França… é mesmo aqui ao lado, talvez, esteja já prevista uma dotação orçamental para o mesmo fim, no próximo O.E., seja do Sr. Sócrates ou da Sra. Leite. Quem sabe, se não estará em curso a criação do "Ministério dos Bons Costumes"!

- mulheres no Sudão que usam calças, são chicoteadas em público: plena ousadia em pleno século XXI!

Assim, fiquei suspensa num outro tempo incerto, o tempo dos outros, não o meu que me veste a alma, e me despe olhar... este é o tempo primitivo onde a estupidez de quem legisla é atroz. Os arquétipos do "Estado Social e Liberal", são destruídos pelas notícias de rodapé que ninguém liga, pois o importante são os milhões da bola rolante e as aventuras amorosas de estrelas sem brilho.

Tentar um paralelismo entre a França e o Sudão não é fácil, mas estas "pequenas" notícias reflectem o enquadramento (lá quadrados são…) da legislação destes dois países distantes e diferentes nas mais diversas áreas, mas a essência das duas notícias é a mesma, numa gradação diferente: a multa administrativa e a condenação judicial.

O Estado pacóvio gosta destas coisas! Educar o povinho, renegando assim, a verdadeira educação, cerceando as liberdades elementares e privadas, nas quais o Estado não tem que se intrometer. Este Estado metediço que acredita que deve solucionar questões do foro privado e emocional dos seus cidadãos, que pensa ter o condão de decidir e deliberar (consoante seja um órgão singular ou colectivo) sobre a vida privada de cada um.

Esse mesmo Estado cujos magistrados passam pelo Largo do Limoeiro, junto à Sé de Lisboa, com uma carga lectiva de 9 unidades em psicologia judiciária, segundo o relatório de XXVII do curso normal do C.E.J. Assim, arroga-se do que não tem condições técnicas para saber. A preparação em psicologia dos nossos magistrados é quase nula, alicerçada, por vezes, a uma curta experiência de vida, o que os torna incapazes para exercer a dita função pública. Quem se der ao trabalho de analisar as componentes e cargas horárias do referido curso do C.E.J., verificará como a justiça só pode ser lastimável e pueril, por frágil e desadequada da realidade. Não esqueçamos que o C.E.J. detém o monopólio na formação dos nossos magistrados. Esta questão dá pano para mangas, como dirá a gíria popular.

O conceito de Estado da dita actualidade, não passa duma máquina mimética, dum paternalismo fora de tempo, que se aproveita do conhecimento do tecido social e económico deste Portugal plantado a Oeste da Europa e vista sobre o imenso oceano Atlântico, para esticar os seus tentáculos de invertebrado a práticas totalitárias (de esquerda ou de direita, o problema já não é esse…) e aceitar como prática normal, prerrogativa duma democracia balofa e doente, que determinados senhores do M.P. mintam à boca cheia! Assim, se escoam parte dos nossos impostos para pagar a esses senhores mentirosos. Se alguém me processar pelo que acabei de escrever, neste espaço que subscrevo completamente, poderá fazê-lo, pois tenho provas mais que suficientes do que acabei de escrever... mas a água lavada leva tudo à frente…

Quase tudo ficou por dizer, sobre este Estado pacóvio e paternalista, que se comporta como um padre moralista, não no sentido dum Deus libertador e acolhedor de todos nós, aquele que acredito existir dentro de cada ser, mas de alguém sem moral, sem ética, de alma pesada…

Este não é o meu tempo certo, é o tempo incerto de quem se esqueceu que a alma e o coração comandam a vida.

O Estado gosta de nos intimidar com placares electrónicos a piscar: “mortes, feridos na estrada… não beba, não fume, descanse, durma…” – esta não é uma função do Estado, só mesmo uma sociedade pacóvia, se permite a esta propaganda incongruente. Temos radares escondidos, com agentes pidescos atrás de postes e de árvores na caça à multa… este é o Estado pacóvio que nos permitimos, da estupidez, da pequenez, do cinzentismo dos serviços públicos, dos tribunais que mais parecem hospitais, com carrinhos de metal ferrugentos, com uma pilha de papelada sem sentido a ser transportada dum lado para o outro, como quem transporta medicamentos numa entidade hospitalar pública. Não vou falar do escândalo que se deu no Hospital de Santa Maria e na cegueira dos doentes, que acreditaram numa instituição de saúde pública…
ficará para um próximo momento incerto.

O paralelismo entre a saúde e a justiça ficará para uma outra abordagem, pois muito haverá para dizer.

Faz sentido citar um dos meus Mestres, o Prof. Agostinho da Silva: “A velha história da lógica metida na vida. Há que subir as escadas para chegar ao terraço”.






Imagem 1: este Estado pacóvio...

Imagem 2: o Sr. Francisco... obrigado, por tudo o que me ensinou!

Imagem 3: eu, num local onde penso voltar um dia, talvez de vez - Sagres, e tudo o que aprendi com os pescadores dessa vila onde se avista o infinito.
Talvez, esta seja mais uma homenagem ao Sr. Francisco, do qual já falei no meu "Momento Certo", pois o que aprendi com esse pescador, hoje com quase 80 anos e que nunca soube ler nem escrever, foi mais importante do que tudo o que podia ter aprendido nas mais conceituadas faculdades do mundo...
o Sr. Francisco é uma das maiores referências da minha vida...

11 comentários:

  1. No Sudão, Lubna será chicoteada por ser uma mulher que se pretende livre...

    Chris, a indignação é geral!

    Cabe à imprensa divulgar ainda mais tal absurdidade contra sua representante - Lubna é jornalista.

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  2. Eis aí uma expressão que eu ainda não tinha visto: estado pacóvio...identifica bem a situação atual.
    beijos, lindo domingo

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  3. Bar do Bardo: notícia que pouco se falou na comunicação social... mas, temos o direito à indignação.

    Sonia Schmorantz: é verdade, infelizmente.
    bjs

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  4. Linda Amiga:
    Realmente, concordo consigo. É, mesmo, uma sociedade "pacóvia" que, em vez, de progredir rumo à modernalidade, recua, perde terreno e coloca-nos a pensar no estado das situações mais opressoras e mais incríveis.
    É a vida que vivemos com desencanto, tristeza, mas, principalmente, admiração.
    Olhe, é talentosa, brilhante, extraordinária, no que faz.
    Escreve fabulosamente, num texto riquíssimo pleno de verdade e interesse.
    Parabéns sinceros. Hoje, aprendi algo que vê, sente e reflecte.
    Adorei.
    Com imenso respeito e estima.
    Beijinhos amigos perante a significação gigantesca de genialidade que possui.

    pena

    MUITO OBRIGADO pela visita simpática e linda.
    Fico-lhe grato.
    Bem-Haja, admirável amiga.

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  5. Querida,

    Que bem me soube ler o que me vai na alma.
    Muito obrigada mesmo...de coração.
    Mas está na moda "estou bem com a minha consciência"...e estes pacóvios têem consciência?.
    Também me sinto cada vez mais... "num momento incerto" e por mais que faça, parece não ter volta a dar!.
    Temos as receitas...mas ninguém/poucos querem utilizar e colocar em prática...depois dá no que dá.
    Bem-haja, obga.
    Mer

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  6. TENS TANTA RAZÃO NO QUE DESCREVES..., MUITAS REFLEXÕES NESTE TEU TEXTO... PANO PARA VÁRIAS MANGAS...
    ÀS VEZES É COM OS HUMILDES QUE APRENDEMOS AS GRANDES E MAIORES VERDADES DA VIDA PORQUE SENTIRAM E EXPERIMENTARAM AS COISAS NA PRÓPRIA PELE...

    BEIJO
    GOSTEI DE LER-TE

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  7. Quem havia de dizer?

    Em França que esteve sempre na vanguarda da modernidade.

    Mas a culpa é dos franceses.

    Porque é que elegeram o Sarkosy.

    Com esses e outros que tais

    só pode dar nisso:

    esconder o sol com uma peneira.

    desviar as atenções daquilo que é realmente

    importante para as pessoas.

    Beijinho

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  8. Pena: retribuo para si tudo, com amizade e carinho. Muito obrigado...

    Mer: pois, temos que acreditar que podemos mudar alguma coisa, mas com a idade perdemos e fogo e ganhamos lucidez... acreditar que pudemos mudar o mundo, talvez seja uma utopia... não sei. Um beijinho

    Pedrasnuas: a reflexão do estado social em que vivemos é fundamental... Obrigado pelas tuas palavras únicas.

    Vieira Calado: foi precisamente isso que pensei quando ouvi a notícia: França - e a sua revolução... fiquei a pensar...
    Um abraço pela visita preciosa...

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  9. A alma e o coração deveriam comandar a vida sim.
    Mas, tristemente, no tempo certo em que escrevo é o interesse materialista o rei e senhor...

    BFS
    Maria Faia

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  10. Maria Faia: acredito que algo já começou a mudar, a nova era entra da mansinho, como uma brisa suave neste despertar de consciências. Podemos sempre tentar dar o nosso pequeno contributo.
    Um abraço,
    Chris

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  11. Passei para agradecer pela visita. Gostei de conhecer sua alma; volto para ler mais aqui.
    Abraço.

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