sábado, 4 de julho de 2009

Chaves da previsibilidade



A forma como a sociedade se enforma, deforma todas as ideologias do pensamento clássico, talhado por uma plano inicial, não iniciático (esse pertence ao meu momento certo), onde continuamos a pensar que a separação de poderes protagonizada por Montesquieu permanece. Puro engano, mera cegueira da realidade social do século XXI, que dizem ser aquele que se iniciou há nove anos, nesta contagem do tempo gregoriano, espécie de gestualismo impressionista dos nossos dias correntes e solares.

Já o escrevi que estou cansada de falsas esculturas lapidadas a plástico, por muitos homens e algumas mulheres que gostam de imitar os homens, no seu pior. Não existe separação efectiva de poderes, entre o poder legislativo, executivo e judicial. Todos sabemos de "fantásticas" leis e decretos-leis que são elaborados na A.R. para privilegiar uma das partes num qualquer processo judicial. Não nos esqueçamos do caso “Casa Pia” e a alteração legislativa do D.L. 59/2007, ao nº3 do artº 30, do Código Penal. Nunca foi notícia de nenhum telejornal, nunca ouvi ninguém falar desta questão perturbante nos órgãos de comunicação social, por isso, o povo permanece adormecido. Qual separação de poderes? Uma gota de veneno inquina todos os oceanos da Terra, pois todos eles estão todos ligados. A próxima guerra da Humanidade será a da Água, mas disso falarei oportunamente, pois continua a ser mais importante a transferência futebolística dum rapazote que nada sabe fazer, a não ser dar uns chutos numa bola, do que as grandes questões que deveriam protagonizar a nossa comunicação social.

Todos procuram chaves e chavitas para um possível destino, esquecendo-se que é de dentro que tudo nasce. O dia nasce da noite, e não o contrário, como querem por vezes ensinar-nos em grandes compêndios, sem qualquer brilho lunar.

Quando somos alvo dos mais mundanos disparates, alguns deles numa tentativa de frutificação sem frutos, pois nem folhas, nem caule, nem raízes existem, apetece subir o tom da voz e do olhar aos ditos cujos (políticos executivos e legisladores, magistrados judiciais e do M.P.) que por aí proliferam, alguns deles (cada vez, mais!) numa atitude de arrogância, pequenez e muita estupidez, como putos da escola primária, no corredor dum qualquer parlamento ou tribunal. Um episódio caricato que vivi há pouco tempo, fez-me lembrar os tempos da escola primária, dos corredores e das salas de aula. Como a atitude do ex-ministro da economia, revela na sua essência, do mesmo padrão de evolução civilizacional, desenhada por punhos maioritariamente masculinos.

A base do sistema social onde assentam os poderes são terrenos movediços, intrincados e viciados, com dogmas que as vidas, de tão célere urgência quotidiana aceitam sem pensar.

A chave está dentro de cada um de nós, cada um reconhece a sua… confesso que a minha não está no plano social, procuro reencontrar emoções esquecidas, abrir a porta a sentimentos fundidos, mas existe um pequeno lado meu, de consciência social.
Foi há muito tempo que li “1984” de George Orwell… velhos tempos do liceu, das fugas para uma das minhas paixões naquele tempo: a companhia de teatro amador onde tanto aprendi, e no dia que acabei de ler esse livro, quase abri a cabeça involuntariamente a um colega do teatro, quando arrastava uma longa mesa pontiaguda, estávamos na fase final de ensaios duma peça do Garrett. Não sei porquê, mas associo sempre o Orwell com esse episódio da minha vida, que de tão teatral foi quase real. Mas… 1984 há muito que foi ultrapassado, torturado pelo próprio tempo, pois vinte e cinco anos depois, a ficção deu lugar a uma realidade trespassada por ela própria.


Dizia assim, a contra-capa do referido livro:

“Tirou do bolso uma moeda de vinte e cinco centavos. Ali também, em letras muito minúsculas porém nítidas, liam-se as mesmas frases: do outro lado, a cabeça do Grande Irmão. Até mesmo da moeda, aqueles olhos o perseguiam. Nas moedas, nos selos, nas capas dos livros, nos distintivos, nos cartazes, nos maços de cigarros – em toda a parte. Sempre os olhos a fitar o indivíduo, a voz a envolvê-lo. A dormir ou acordado, a trabalhar ou a comer, dentro ou fora de casa, na casa de banho ou na cama – não havia fuga. Nada pertencia ao individuo, excepto alguns centímetros cúbicos dentro do crânio”.

George Orwell , in “1984”, escrito em 1948 (a inversão do tempo foi um presságio concretizado). Quem consegue escrever hoje o “2090”?

É uma chave de difícil previsibilidade…

15 comentários:

  1. O MITO DAS ESCULTURAS LAPIDADAS A PLÁSTICO... EXISTEM PORQUÊ? ELAS EXISTEM PORQUE A SOCIEDADE DO IMEDIATISMO E DA FRIVOLIDADE CRIOU...
    A SEPARAÇÃO DE PODERES É FICÇÃO PARA VIVERMOS NESSA ILUSÃO...ESTAMOS MAIS PERTO DO QUE NUNCA DA PROMÍSCUIDADE DE PODERES...
    AS GRANDES QUESTÕES PASSAM À MARGEM...
    NINGUÉM QUER PENSAR EM ASSUNTOS SÉRIOS...ISSO É CHATICE,ENFADONHO,DÁ TRABALHO...E HOJE ANDA TUDO MUITO MAIS FÁCIL ...A CULURA NO FUTEBOL NA CRISTA DA ONDA...
    FORAM CENTAVOS ,FORAM...
    HOJE NÃO SE CONSEGUE PREVER O 2090,NEM ME ATREVO.A NÃO SER POR FANTASIA,SERÁ QUE NESSA ALTURA A HUMANIDADE VÁ EXISTIR?
    SÓ SEI QUE NADA SEI...DIZIA ELE E DIGO EU

    BEIJINHO

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  2. Não sabia que tinha este blog, mais fiquei fascinado pelos textos, o mundo espera por si. É preciso que alguém diga as verdades e concordo com o que diz, quem faz as leis são homens e quem as aplica também. às vezes, até as discutem no café, entre eles deputados e juizes. Estamos à espera de quê para mudar?
    Carlos

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  3. Ora Chis, neste teu "momento incerto" encontrei um lado teu, em que combinamos e muito!
    Embora ame profundamente a Vida,e creio que por amá-la tanto... tendo certeza de que algo irá mudar, que seremos ajudados por um Poder Maior que o desses "grandes-pequenos-homens-cegos", que dirigem nações sem noção da responsabilidade que assumem perante A Lei Maior, para mim do Amor... brincam , pois encontram seus "iguais" entre os menores que usam antolhos e não sabem olhar para os céus. Se existe os astutos homens é porque existem os que se deixam levar.
    Hoje...ninguém é mais inocente. Já conhecemos mais, e nosso erro contra os Príncipios é maior.
    No passado, éramos crianças e nada sabíamos , hoje... há que se pensar e mudar!
    Lindo este Blog também!
    Beijos n'alma!

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  4. A água dos oceanos já está inquinada...

    antes da gota final, fatal.

    Muito bom o seu texto.

    Cumprimentos

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  5. é tãobom ler um texto tão denso, reflexivo, mas que não deixa de lado o lirismo e o gosto doce de palavras bem escritas.

    fico muito feliz com sua visita.
    voltarei sempre e sempre.
    beijo grande.

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  6. Pedrasnuas: pois, também não sei se a humanidade ainda existirá em 2090... bjs

    Carlos: urge mudar, é verdade. Obrigado

    Maria Isabel Viegas: a Lei Maior prevalecerá diante de todas as leis menores.
    Muito obrigado pelas palavras.

    Vieira Calado: obrigado por ter passado por aqui mais uma vez.
    Abraço

    Roberto Ney: este é o outro lado do meu "Momento Certo", que bom ter gostado.
    bjs

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  7. Oi Chris,

    Passei para agradecer tua passagem pelo meu espaço.Gostei muito de teus textos e postagens.
    Serei seguidora atraída pelo fazer bem feito,e
    pelos preciosos pontos de vista.

    Com carinho,

    Cris

    PS-Assino mais alguns blogs e gostaria de convidá-la a conhecer:www.cristinasiqueira.blogspot.com

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  8. Hoje, como ontem, continuamos a lutar contra a uniformização das pessoas e das ideias.
    Lutamos pela liberdade de pensar e de ser. Para reencontrar e viver emoções e sentimentos.Para sermos mais do que simples peças de uma engrenagem...

    Um beijo

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  9. A sua informada e profunda análise, inspirada num dos meus livros preferidos, leva-me a deixar algumas mas observações que, se por ventura pecam por pouco originais, não constituem plágio consciente, pois nunca as li ou ouvi como tal.
    Muito do que se falava no 1984 já existia (não globalmente, não nos contornos descritos, mas existia). No entanto, dois dos mais amargos sabores imaginados por Orwell, apenas agora, na minha opinião, assumem contornos perigosamente aproximados dos previstos: i) as bombas que, em qualquer momento e em qualquer lado poderiam cair, criadoras de um latente medo, proficuamente nutritivo para o status quo, não será o terrorismo actual? ii) e a capacidade técnica de receber e transmitir imagem não tomou a forma de um monitor e uma webcam? Mas há uma diferença fundamental: o poder deste último pode ser, no nosso 2009, arma de liberdade... para que isto possa assim ser, esta arma tem que ser, contínua e maioritariamente, utilizada como tal.

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  10. Cristina Siqueira: muito obrigado pelas palavras, logo que possa vou ver o seu blogue.
    Um beijinho

    Simplesmenteeu: entender as diferenças é algo de positivo, quando sabemos integrar o que é diferente na eterna semelhança dos seres humanos. Sei que é um trabalho dificil, mas vale sempre a pena tentar. Bjs

    Lago Mudo: é um privilégio ler comentários assim. Tudo pode ser utilizado para o melhor e para o pior, temos que seguir o caminho da liberdade, acabando com os medos que incapacitam o mundo de evoluir. O que aqui escrevo são pequenas divagações minhas, muito longe de qualquer análise profunda... mas de qualquer forma obrigado pelas seuas palavras, que nos fazem pensar a todos.

    Chris

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  11. Esta semana assisti a uma entrevista interessante sobre o mundo e como nosso planeta vai mudar, aqui no Brasil apesar da imprensa Mundial alardear que "ele é o cara" estamos em crise moral no senado e também tivemos dias nublados no judiciário até então intocado, o povo brasileiro enquanto isso fica as cegas sobre problemas enormes como nossa Amazônia, nada se resolve sobre uma nova legislação, e todos se voltam para o quê?
    Ronaldo volta a jogar no corinthians, e tudo fica em suspenso, enquanto isso o Presidente do Senado grita que não deixa o cargo, o que vai investigar diz que não deve nada ao povo, e quem sabe Maria Antonieta bate novamente seus sapatos e volta com sua frase histórica, "daqui não levo nem o pó em meus sapatos" enfim meu país sofre da famosa cegueira cultural, política e sabe-se lá do futuro. DESCULPA SE ESCREVI BOBAGENS, afinal diante de ti sinto um tanto inculta.

    Renata Vasconcellos.

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  12. Impossível, não se consegue prever mais nem a ficção deste instante...

    Chris, por isso me dou à poesia.

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  13. Renata: de forma alguma, disse aqui neste espaço grandes verdades e acredite que adoro o Brasil... a música, a literatura, as terras e as suas gentes, afinal une-nos um grande património mundial: a língua portuguesa.
    Muito obrigado por todas as suas palavras.
    Um beijinho para si

    Bar do Bardo: completamente de acordo. Também, não sou nada dada a previsões, prefiro ler poesia e fluir...
    Um abraço

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  14. Simplesmente adorável. inteligente e sedutor este texto.
    Bj

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  15. AnaMar: foi um prazer a sua passagem por este espaço incerto. Obrigado

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