
Nesta tarde quente de Domingo, fui ter com uns familiares que têm uma casa num dos bairros típicos da velha Lisboa, e ao passar na R. do Século junto ao Tribunal Constitucional (palácio da antiga família Ratton do séc. XVIII, que se dedicou à chapelaria), comecei a costurar algumas ideias para este “post”.
A separação de poderes do Estado, teoria da tripartição desenvolvida por Montesquieu, torna-se cada vez mais híbrida, as áreas indefinidas alastram, pois o “Estado” assim o permite, ou seja, “NÓS” deixamos!
As eleições (autárquicas e legislativas) aproximam-se com as guerrilhas habituais de quem usa a política como uma função e não como uma Missão. Os missionários, ou estão em vias de extinção, ou partiram numa longa viagem, sem regresso certo.
O regime semi-presidencialista está a dar lugar a um sistema cada vez mais parlamentar, pois na prática o Presidente da República começa a estar cerceado em algumas áreas de actuação.
Segundo a opinião maioritária e favorável de cinco juízes do Tribunal Constitucional, e o voto contra de dois conselheiros (um deles o presidente deste órgão colegial, o Dr. Moura Ramos), não existe qualquer inconstitucionalidade na norma do novo código de execução de penas, pedida a apreciação da fiscalização preventiva pelo Presidente da República. Maioritariamente para o TC, tal norma não põe em causa a reserva de jurisdição do caso julgado, mediante a colocação em regime aberto, de reclusos depois do cumprimento de um quarto da pena. Essa decisão passará a ser da competência do Director-Geral dos Serviços Prisionais, que ocupa um cargo administrativo, na dependência directa do poder executivo.
Do ponto de vista meramente jurídico, mais uma vez temos um caso concreto, que personifica a mitigação dos poderes, e onde existe uma decisão administrativa que coarcta uma decisão (singular) ou deliberação (colectiva) judicial.
Mas serão as decisões judiciais intocáveis?
São tocáveis e cada vez mais, mas não desta forma.
Já aqui sublinhei a ideia, que os magistrados em geral, têm uma formação parca na área da psicologia e da sociologia, isto para não parecer utópica e entrar no campo filosófico, cadeira que se leccionava no último ano do curso de direito, provavelmente em vias de extinção com o acordo de Bolonha. A teoria economicista da competitividade continua a fazer muitos estragos, um deles foi a redução do tempo de formação em alguns cursos superiores. As Universidades em vez de serem espaços abertos ao saber, onde a maturação temporal é fundamental em determinadas áreas, correm o risco de se transformarem em fábricas de produção em série de má qualidade, ao estilo das grandes cadeias mundiais de hamburgers.
Transcrevo aqui palavras proféticas de Radbruch, autor que considerei “intragável” nos meus tempos de estudante, mas que hoje considero providas de sentido, neste tempo de programinhas eleitoralistas sem qualquer sentido, neste barco quase fundeado a que ainda chamamos Portugal:
“… a ideologia dum partido transborda para fora do quadro dos seus interesses materiais. É sabido que os exércitos da luta política têm também necessidade de estender o mais possível a sua linha de frente ideal, a fim de evitar a surpresa de serem envolvidos. A constante luta entre eles obriga-os necessariamente a terem uma solução programática para todos os problemas da vida pública, inclusive para aqueles que pouco ou nada têm a ver com os seus interesses originários…”
Gustav Radbruch [1878-1949], in “Filosofia do Direito”