sexta-feira, 29 de maio de 2009

Ossos dum ofício pouco justo






















Ao contrário de tudo o que aprendi na retórica dos bancos da escola, ao contrário de todas as teorias formalizadas nas leis escritas pelo punho inconsequente dos homens, este é o tempo presente da completa inversão de valores, dos mutantes momentos incertos, os momentos que não estão dentro de mim, os momentos domados pela estupidez humana.

Um senhor juiz, de seu nome Gouveia de Barros, sim porque os senhores magistrados sejam eles judiciais ou do M.P., têm um nome, um rosto, um olhar, são gente de carne e osso, têm sangue arterial a correr nas artérias, sangue venoso por purificar nas veias, talvez alguns tenham coração, talvez alguns tenham cérebro… ou talvez, não.

Gosto de assistir a rostos com a expressão da alma, olhares radiografados pelo sentir, emoções que escorrem da essência a que chamamos humana, ao que vem de dentro, mesmo quando esse dentro é aparentemente pouco preenchido. O que assistimos hoje na comunicação social, foi uma voz que dizia ser o supra-referido juiz, que balburdiava (penso que não está no dicionário, mas gosto de suscitar novas palavras, quando apropriadas...) umas cogitações sobre o caso chocante da criança (por sinal, uma menina… ) de seu nome Alexandra, mas podia ser Manuel . Os nomes das crianças não interessam, mas os nomes dos magistrados judiciais e magistrados do M.P. interessam, pois quando algo está errado, é preciso denunciar (não gosto da palavra, mas não encontro outra...) com todas as letras.

Não esqueçamos que os senhores juízes têm uma licenciatura em direito, como qualquer cidadão vulgar pode ter, e uma breve passagem pelo Largo do Limoeiro, na minha velha Lisboa, junto à Sé… fui lá algumas vezes, a primeira em 1999 quando acabei o curso, pois pensei na possibilidade de ingressar na magistratura judicial, mas um casamento e um projecto de vida a dois, demoveram-me desse intuito. Percorri outros caminhos, os quais naquele tempo acreditei. Voltei ao Largo do Limoeiro (árvore que frutifica limões, que fazem excelentes limonadas, de preferência sem açucar...) uns anos mais tarde, para outras diligências.

É triste o que se está a passar neste berloque plantado junto ao oceano Atlântico, a que ainda chamamos Portugal. O descrédito no aparelho judiciário e judicial (não são sinónimos) é total, como se assistiu mais uma vez, nas últimas horas passadas neste recanto do planeta Terra. Um juiz não pode proferir cogitações e tristes lamúrias pendentes de nada, como hoje se assistiu na comunicação social. Fiquei com a sensação de estar a ouvir (pois não lhe vi o rosto, nem o olhar… o que para mim é fundamental) um puto a falar duma guerrilha num jardim de infância.

O estereótipo daquilo que se chama prova, no sistema jurídico-penal, terá que ser repensado, pois o Q.E. (coeficiente emocional) em determinados processos judiciais, sobretudo criminais é muito mais que urgente. Sei do que falo, por experiência própria, conheço o sistema por dentro, os podres que se acobardam em despachos irrecorríveis, pois a lei (seja lá o que for…) não o permite. Há poucos dias, tive náuseas quando me sentei diante dum senhor que diz ser delegado do M.P., com um dos seus dois membros inferiores a bater no chão, num ritmo cadenciado mas sem musicalidade, a menos de dois metros de mim. Percebi como estava incomodado com a minha presença, como a sua voz encolhida sentia a mentira que a lei lhe permite. Não sou de denunciar ninguém, mas existem determinadas questões que não aceito, quando me atiram à cara, que há despachos que não se discutem, mesmo quando vertem mentiras com cara, num rosto definido de descaramento total. Chamo a isto: falta de digninade no exercício da causa pública... mas o pecúlio ao fim do mês (ainda?) está assegurado, enquanto o povo continuar a pagar para estes senhores fazerem brilharetes nos trocadilhos que as leis lhes permitem.

O caso Alexandra, demonstra os podres do sistema que urge mudar…

O senhor juiz ficou incomodado, chocado e penitencia-se pela sua decisão (citação literal das suas palavras), não previu (juízos de previsibilidade e probabilidade que se estudavam no 4º ano em direito penal, como estudei com o contributo valioso do Dr. Frederico Costa Pinto), que parece que este sr. juiz desconhece.

Ossos dum oficio pouco justo…

segunda-feira, 25 de maio de 2009

Xeque-Mate




Este será o espaço da minha visão político-jurídica, com ténues laivos de economia, a minha percepção dos outros, do quotidiano, dos caminhos que os homens grandes tentam trilhar e que os pequenos demovem na sua encefalia minorca. Este será o espaço dos outros, pois o meu lado certo continua no "Momento Certo": www.omomentocerto.blogspot.com

No ano de 1989, depois de algumas tentativas falhadas em outros cursos superiores, nomeadamente, sociologia e psicologia, entrei em Direito, na U.A.L. , pois faltaram-me 0,1 décimas para entrar na Clássica de Lisboa, chamava-se assim, penso que ainda é assim…

Valeu a pena, tudo o que vivi, o que aprendi, os professores, alguns amigos que hoje permanecem… Tantas histórias por e para contar… talvez por aqui.

No primeiro ano da faculdade estudei ciência política, com o Dr. João Proença de Carvalho… eu, miúda (hoje, considero que o era naquele tempo…) de 23 anos ficava fascinada com as aulas daquele senhor alto e moreno, que falava de sistemas políticos, da República de Weimar...
... e “Xeque-Mate”, de Maurice Duverger, foi o início dum caminho na minha consciência política. E eu que nem sei jogar xadrez, só damas e muito mal…


Aqui ficam algumas transcrições literais de parte do prefácio da edição portuguesa, de 1978:


“XEQUE-MATE é publicado em Portugal no momento em que o problema dos poderes presidenciais se situa no centro da actualidade…

Lembremos que se trata dum livro de ciência política e não duma obra partidária, como um biologista descreve os equinodermes ou as criptogâmicas…

Desde que este livro surgiu, dois acontecimentos importantes se produziram nos regimes semi-presidencialistas: as eleições francesas de Março de 1978 e a actual crise portuguesa. Eles confirmam as análises da obra. Valéry Giscard d’ Estaing tem praticamente adoptado a interpretação de XEQUE-MATE quanto aos poderes de um presidente colocado perante a maioria parlamentar oposta à sua política: rompendo assim com os seus predecessores. O seu comportamento desde a sua vitória mostra a clareza que o declínio do poder do chefe de Estado entre 1974 e 1977 devido à situação política com a mesma energia do general de Gaulle ou que Georges Pompidou se beneficiasse dos mesmos meios e isso verificou-se…

Afirmar que se passa ou que se tentou passar de uma interpretação parlamentar e uma interpretação presidencial da Constituição portuguesa, não tem sentido. Ela estabeleceu um regime semi-presidencial, que não é totalmente parlamentar, nem totalmente presidencial, mas que une os dois aspectos. O sistema debruça-se de um lado ou de outro segundo a relação das forças políticas, muito mais que a vontade dos homens…

Tal é a lógica do sistema. Foram necessários 20 anos aos franceses para compreenderem o regime semi-presidencial; não poderia acusar os portugueses de compreender mal o seu, num prazo dez vezes inferior. Espero que a leitura de XEQUE-MATE lhes faça ganhar tempo.”


Maurice Duverger, in “Xeque-Mate” [1978] (*)


(*) estamos em 2009 e poucos leram XEQUE-MATE…

Foto 1: Corria o ano de 1989...
Foto 2: Capa da edição portuguesa de XEQUE-MATE.